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M(ã)emórias da Maria Mocha

Blogue pessoal que aborda o universo feminino, maternidade, adolescência, resiliência, luta e superação do cancro, partilha de vivências, vida familiar e profissional... e alguma reflexão com humor à mistura.

M(ã)emórias da Maria Mocha

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No concerto ("Alservando"... # 1)

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(fonte referida no cartoon)

 

Sabem aquelas pessoas que não conhecemos de lado nenhum e damos com elas a fixar-nos com o olhar parado, a observar algo em nós de forma insistente? Daquelas situações em que, como não conhecemos a pessoa, instintivamente olhamos à volta para confirmar se é para nós que está a olhar? E quando verificamos que é, sentimos vontade de ir lá perguntar: "Passa-se alguma coisa?" Arrepiante, não é? 

 

Pois bem! Se alguma vez passarem por isso... posso muito bem ser eu.  Por isso, antes de começarem a disparatar com a pessoa perguntem: "És tu, Maria? Dá cá um abraço, melhere!" 

 

Efetivamente eu sou muito observadora do que me rodeia. Eu disseco tudo à minha volta e construo até estórias à volta daquilo que vou observando: desde razões para determinados comportamentos, a circunstâncias da vida alheia, a finais felizes ou não,... Até empatia, admiração ou hostilidade crio com quem observo, dependendo do que observo. E tudo isto sem conhecer as pessoas de lado nenhum. Mas não se preocupem, que eu faço tudo isso de forma muito discreta. E quando corre mal, tenho sempre um truque na manga para disfarçar (sou pouco esperta, sou!), nem que seja assobiar para o lado. Resulta sempre. 

 

Se eu fosse a contar todas as vidas observadas só no outro dia (do concerto), tanto na confusão para jantar no Vasco da Gama como no Meo Arena, era matéria para uma dissertação de mestrado. Aquilo era uma autêntica incubadora de estórias. Mas não posso contar tudo, senão nunca mais me visitam, né? Escolho só duas, então.

 

Uma:

 

A da mulher diligente dona de casa, despachada e dedicada a arranjar mesa para ela e para o maridinho que havia de chegar com os tabuleiros de comida já que, pelo aspeto do pintas, pequenino e franzino saltitão, convinha ter tudo orientado assim que ele aparecesse.

Por isso, ela vai e dirige-se a uma mesa com espaço para 4 pessoas, e como se estivesse em casa a pôr a mesa do jantar, retira os tabuleiros usados que ali foram deixados, inclusivamente o que estava à frente do homem que ainda se encontrava sentado na mesa a olhar para o telemóvel.  Assim, sem mais nem menos, como quem diz: "Sai lá daí, que tu já comeste e agora é a minha vez e do meu morzinho!". E ele saiu. Estava mais preocupado em ir ver "The Cure", foi a sorte dela.

Dali a pouco, estava já o casal enamorado instalado em duas mesas encostadas (logo, o espaço de 4 lugares), quando chega um grupo de raparigas que se lhes dirigem a pedir espaço na mesa (educadas, estas pediram.). Sem meias medidas, a (para mim já nesta altura) viril mulher-home, afasta de forma decidida mas com alguma má vontade uma das mesas encostadas para elas se poderem sentar, bem longe do morzinho dela, como se as coitadas tivessem a peste.

Não acompanhei mais a cena porque chegou a hora do concerto. Afinal, a estória da vida daquele casal talvez tivesse mais a ver com domínio dela sobre ele e consequente aniquilamento do coitado do que o que me pareceu à primeira vista. 

 

Duas:

 

A da jovem à minha frente no concerto, que surgiu acompanhada de um homem mais velho, muito delicado e amoroso com ela e que excluí logo que fosse pai e filha. Toda ela era mimo, todo ele era amor. Que romântico! Até me apeteceu dar uma cotovelada ao M, que estava a meu lado sem me ligar nenhuma, enquanto aquele homem lhe acariciava quase em permanência o braço e o ombro que envolvia num abraço quentinho.

Naquele casal, o mundo circula à volta dela, dos caprichos dela, das vontades dela. A não ser o concerto, porque ali era nítido que ela estava por ele e não por ela. Apercebi-me disso quando verifiquei que passou o concerto com alguma hiperatividade. Ora mexia na mala, ora olhava fixamente para o lado, ora para trás.

Pensei:"Eh lá! Esta é das minhas. Fixa o povo em redor, observa tudo. Está a olhar para mim, agora?" Toca de olhar à minha volta, para ver se era comigo a fixação, mas não consegui perceber.

Continua a irrequietude. Saca de uma sandes, que devora com apetite. Olha para trás, muitas vezes. Na cara estampado um sofrimento inexplicável. Pega numa écharpe e coloca à volta do nariz e da boca, que eu imagino estar a fazer beicinho por baixo. Segura com a mão para não cair, compõe um sem-número de vezes, tosse, olha para trás, volta a tossir, encosta a cabecinha no seu amor e ambos colocam as mãos na barriga dela. Estico o pescoço para lhe ver a barriga. Fez-se luz. Estava grávida, daquelas gravidezes que se confundem com uma doença.

Espera aí! Já percebi! Ela está tão inquieta é com o fumo do tabaco. Olho para trás. Exatamente. Lá em cima, em pé, uma fila de pessoas a fumar. Era para aí que ela olhava, como quem dizia: "Vejam bem o que estão a fazer, que eu estou aqui!" Mas, espera. Olho para a sala. Há fumo por todo o lado. Se fossem só os de lá de trás, estava ela bem. Elementos mais presentes: fumo e telemóveis levantados.

Inadvertidamente eu tusso. A asma. Ela olha. Dirige-se ao companheiro e imagino que lhe diz que há ali gente solidária com ela. E eu fiquei muito contente, não sei bem porquê. Acho que senti que aquela espécie de solidariedade podia dar-lhe algum conforto.

Logo me lembrei que, em 5 de maio de 2002, grávida de 6 meses do caçula, estava eu lá em baixo na plateia com o M, em pé, com uma barriga mais proeminente do que a jovem, a assistir ao In The Flesh World Tour, do Roger Waters. E se havia fumo! Fumos! De todos os tipos. Até aromatizados com ervas, se é que me entendem.

Penso que não é permitido, mas efetivamente fuma-se nestes espaços. No entanto, não consta que o meu filho tenha sido prejudicado na sua saúde por a mãe ser doida de ir para o meio da confusão e do fumo assistir a um concerto num dos dias dos 9 meses e um dia que ele viveu em mim. Por outro lado, que hoje adora Roger Waters e Pink Floyd, isso é verdade! Coisa rara na idade dele. Se calhar o que aquela noite fez foi apurar-lhe o ouvido e conferir-lhe algum bom gosto musical...

Oxalá esta grávida soubesse disto e talvez tivesse aproveitado muito mais o concerto. 

 

 

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Maria Mocha é o pseudónimo de uma mulher que, de vez em quando, gosta de deixar os pensamentos fluir pela escrita, uma escrita despretensiosa, mas plena dos sentimentos e emoções com que enfrenta a vida. Assim, as criações intelectuais da Maria Mocha publicadas (textos, fotos) têm direitos de autor que a mesma quer ver respeitados e protegidos. Eventuais créditos de textos ou fotos de outros autores serão mencionados. Aos leitores da Maria Mocha um apelo: leiam, reflitam sobre o que leram, comentem, mas não utilizem indevidamente conteúdos deste blog sem autorização prévia da autora. Obrigada.

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