A propósito do peditório do Banco Alimentar...
(Foto chocante encontrada na net. Não deveria ser possível ver imagens destas neste bonito planeta azul que é de todos nós...)
Dezembro é o mês dos peditórios do Banco Alimentar por excelência.
Desenganem-se se pensam que eu vou falar da importância da "caridadezinha" para com os pobrezinhos. Não vou porque não acho nada humano existir essa necessidade no mundo em que vivemos. Ao aceitarmos o conceito, parece-me estarmos a aceitar que é normal haver miséria, e a legitimá-la. Para mim, a caridade não deveria sequer ser necessária, assim como a pobreza não deveria existir.
Chamem-me lírica.
Chamem-me utópica.
Chamem-me louca.
Mas eu ainda acredito num mundo onde haja uma melhor e mais justa distribuição da riqueza. E atenção, que eu falo de barriga cheia. O meu dilema hoje em dia está longe de ser contar os tostões para pôr comida na mesa aos meus filhos. Mas não me canso de lhes lembrar que há famílias que não têm sequer o que comer. Eu própria cresci com muito pouco e a ver os meus pais trabalharem desalmadamente para conseguirem dar um futuro mais risonho às filhas. E disso eu nunca me esquecerei.
Mas voltemos ao Banco Alimentar. Não interpretem mal as minhas palavras. Eu até contribuo para a campanha. Para esta e para outras. Porque infelizmente a justiça social ainda é uma miragem. No entanto, sou seletiva onde e em que condições o faço.
No fim-de-semana fui às compras. Precisava de abastecer a despensa com alguma mercearia.
(Arrisquei mais uma vez uma galinha. Nunca me corre bem cozinhar galinha. Fica sempre a puxar para o rijo, por muito que a cozinhe. Lá está! Preocupações de quem tem o que comer...)
Bem, fui às compras a uma loja aqui ao pé de casa, onde vou muitas vezes. Comércio tradicional. Estavam lá miúdos do Banco Alimentar. Como faço sempre, não hesitei em colaborar com alguns víveres, porque assim ajudo quem não tem o que comer e quem se tenta aguentar no negócio do comércio local, que bem precisa.
No entanto, se os mesmos meninos me abordarem numa grande superfície, não colaboro e ainda lhes explico as minhas razões (sou uma mulher de convicções que gosta de endoutrinar, o que é que hei de fazer?). Acho imoral estarmos a dar lucro a grandes grupos que, se quisessem, poderiam oferecer todos os alimentos angariados pela solidariedade de pobretões remediados como eu. Têm capacidade financeira para isso, e ainda gozam de benefícios fiscais ao fazê-lo. Ou então fizessem reverter todo ou parte do dinheiro ganho com a nossa solidariedade para outras ONG de cariz social e humanitário. Alguns até poderão já fazê-lo e se já o fazem (o que eu desconheço), têm o meu reconhecimento.
Seria tão bonito que essas grandes superfícies, elas próprias se chegassem à frente este Natal e recheassem o Banco Alimentar. É que como está, eles só estão a lucrar, mais uma vez, os espertalhões, com a miséria alheia. E ainda passam por entidades com preocupação social, grandes beneméritos, parceiros do Banco Alimentar. Tão bonito! E nós, ao comprarmos nesses grandes grupos, só estamos a compactuar com o estado das coisas.
Por isso, fica o repto (que ninguém vai ler, mas pelo menos desbobinei o que penso).
E ao Banco Alimentar contra a Fome/Isabel Jonet, digo o seguinte: este ano estejam presentes no comércio local, nas mercearias, nos mercados deste país. Esses também precisam de ser ajudados.
Uma nota final:
Não nos podemos esquecer que o Banco Alimentar tem como principal objetivo evitar o desperdício de alimentos, fazendo-os chegar a quem tem fome. Será que ainda o cumprem, ainda é a sua ação prioritária? É que se me perguntarem, parece-me que estão sempre à espera que, sazonalmente, sejamos nós a contribuir. Pelo menos, não ouço dizer mais nada de outras campanhas que levem a cabo. Enfim, posso estar a ser injusta...
Não haverá alimentos nas grandes superfícies que são deitados fora por ultrapassagem da data de validade? Daqueles em que até colocam uma etiqueta de promoção de fim de validade para venderem o máximo que puderem, estão a ver? Porque é que não os dão a quem precisa, antes de se estragar? Até porque as famílias carenciadas não comem só no Natal...
Será que os excedentes de produção da indústria agro-alimentar, agrícolas e da grande distribuição são todos aproveitados? Fica a questão à qual sinceramente não sei responder.