Como é possível nos dias de hoje?
Costumo dar boleia para casa a uma colega que mora perto de mim. É uma pessoa com um estilo de vida já muito pouco usual nos dias que correm. Haveria muito a dizer sobre ela, mas vou fixar-me apenas em duas características. Entre outras particularidades:
- Tem a carta de condução mas não conduz. Até aí tudo bem. Há muitas pessoas que não gostam de conduzir. O problema é que ela também não se quer orientar com os transportes e, por isso, anda sempre dependente de terceiros, de mim inclusive. Chega ao ponto de, quando espera que eu termine o meu trabalho, por vezes vir com muito jeitinho a modos que pressionar para que eu me despache. E confesso que às vezes eu, malandra, demoro mais um bocadinho só para ela perceber que já que precisa das pessoas, pelo menos tem que respeitar e se adaptar aos seus horários. Sou terrível!
- Não tem telemóvel. Quem é que não tem telemóvel hoje em dia? Ela! Já imaginaram viver sem telemóvel? Pois, ela vive, mas depois, às vezes, como acontece com o carro, também precisa do telemóvel de terceiros. Tudo muito natural: não tenho telemóvel porque posso viver sem ele, mas às vezes preciso e uso o teu. Certo? Ok...
É um prato cheio esta minha colega.
Agora peguem nestes seus dois aspetos e temos um episódio engraçado, com direito a replay na mesma semana. Sim, presenciei (e participei!) duas vezes esta semana, apenas com o feriado a intervalar, a mesma situação no mínimo caricata. E é esta constância que me leva a partilhá-la aqui.
Trazia-a eu de boleia, das duas vezes, quando a meio do caminho passa no sentido contrário o marido dela, que a ia buscar. É difícil comunicarem-se, se ela não tem telemóvel... Quase no mesmo sítio, impressionante! Ele não nos viu de nenhuma das vezes. Adivinham o que aconteceu? Ela não tem telemóvel, certo? Das duas uma: ou eu fazia inversão de marcha e voltava para trás com ela até ao ponto de partida ou EU telefonava ao marido dela a avisar que estávamos a meio do caminho. Qualquer das opções, trabalhos redobrados para mim, tudo porque a menina se recusa a aderir aos telemóveis. Não foi preciso pensar muito. Ela, habituada a depender de terceiros (e, diga-se de passagem, muito pouco envergonhada disso), saca de um cartão com o nº de telemóvel dele e passa-mo para as mãos para eu tratar do assunto. Foi o que eu fiz, das duas vezes, com o carro encostado, que eu não telefono a conduzir. Cof! Cof! Cof!
É assim esta colega. Mas pronto, no fim ganhei beijinhos de agradecimento, aconselhei-a a comprar a porra de um telemóvel e, por insistência dela, deixei-a na berma da estrada à espera do marido. Sim, porque ela é uma pessoa que não gosta de abusar da boa vontade dos outros e não quis que eu ficasse a fazer-lhe companhia. Uma querida!