Visita à casa cor-de-rosa
Já fiz a minha visita anual à casa cor-de-rosa! Eu, que nunca gostei muito de cor-de-rosa, passei a ter esta cor tão intrinsecamente ligada à minha história de vida dos últimos anos…
“Como é que tem andado esta rapariga?”
Reconheci logo a mesma voz doce e ao mesmo tempo incisiva que há cinco anos me disse que eu tinha um cancro na mama. E nessa altura disse-mo sem margem para dúvidas, enquanto as lágrimas já prevenidas me rolavam pela cara. Disse-mo com o sofrimento cansado de quem já deu essa notícia mais vezes do que desejaria. Mas eu até já sabia… Soube-o desde que palpei uma protuberância estranha na mama, algumas semanas antes, deitada na minha cama, sozinha, a recuperar de uma infeção urinária, no dia 26 de abril de 2010. Soube-o desde o início! É mesmo verdade! O nosso organismo avisa que algo não está bem. No meu caso sinto como se o meu corpo, ao obrigar-me a parar e a centrar-me em mim própria, me tivesse criado as condições para eu descobrir o que se estava a passar. Em boa hora o fez!
“Estou viva, doutor!”
Sorriu, enquanto se encaminhava para a cadeira que o esperava ao pé de mim, deitada a aguardar a segunda parte do exame, a ecografia mamária. É nesse momento, nas frações de segundo em que o doutor entra na sala, que eu avalio a sua expressão, vindo de analisar a mamografia já feita. Desta vez pareceu-me logo bem-disposto. Aquietei-me. Quando está enigmático, como aconteceu em 2012, quando tive que repetir a mamografia, o tempo para e os minutos que se seguem são eternos e de um sofrimento atroz. Indescritível! A consciência da hipótese, sempre em aberto, de ter que passar por tudo outra vez é terrível! E essa consciência está comigo sempre, todos os dias da minha vida, desde 2010.
Invariavelmente, de há cinco anos a esta parte, todos os anos por esta altura volto à casa cor-de-rosa. E este dia passou a ser o dia do aperto no coração, o dia em que sou pequenininha, o dia que não me deixa esquecer que a qualquer momento a vida dá uma volta de 180° e, quando menos esperamos, a única certeza que temos é que não valemos nada, não controlamos coisíssima nenhuma, porque o bem mais precioso, que é a nossa vida, não a temos nas nossas mãos. Há cinco anos que tenho que lidar com o sentimento de sobrevivência, um sentimento que me confere alguma sobranceria sobre o comum dos mortais, mas que também me obriga a conviver com um fantasma que me acompanhará o resto dos meus dias. E viver com o fantasma do cancro é tão difícil!… Só quem passou por esta triste experiência é que pode avaliar. Pior do que viver com este fantasma só mesmo sucumbir a ele. E isso eu não posso permitir que aconteça!
“Estou viva, doutor!”